Pesquisador da UFPA descreve nova espécie de peixe descoberta
É na maior província mineral de ferro, ouro e cobre do Brasil - uma das maiores do mundo - que vive, nas corredeiras ainda virgens da densa Floresta Nacional de Carajás, uma nova espécie de pacu, que, depois de 30 anos, foi finalmente descrita e cientificamente passou a ser conhecida como Tometes siderocarajensis. O pesquisador doutor Marcelo Andrade, do Grupo de Ecologia Aquática (GEA) da Universidade Federal do Pará (UFPA), acabou de publicar no periódico Plos One, de circulação internacional, a descrição da nova espécie, que é a sétima espécie de Tometes conhecida da comunidade científica, sendo a quarta descrita por ele, que assina a publicação ao lado dos pesquisadores Tommaso Giarrizzo (UFPA), Michel Jégu (Institut de Recherche pour le Dèveloppment - IRD), Izeni Farias e Valéria Machado (Universidade Federal do Amazonas – UFAM).
O Tometes siderocarajensis é um tipo de pacu encontrado na Serra dos Carajás, daí o nome escolhido pelo pesquisador para batizar a nova espécie. Marcelo Andrade revela, também, que esse peixe não é consumido, popularmente é chamado de "Pacu-Borracha" ou "Curupeté", e a carne dura e borrachuda desse pacu de tamanho médio – alcança até 40 centímetros – explica a inexistência do consumo pela população local.
Diferenças marcantes - O novo pacu apresenta em relação aos demais algumas diferenças marcantes. Segundo o pesquisador do GEA, a coloração foi o que mais chamou sua atenção – o siderocarajensis é escuro, quase negro, enquanto os demais apresentam coloração prata. Ele tem formato da dentição e arranjo da arcada bem diverso dos demais, além de alteração no número de escamas e a estrutura óssea do crânio igualmente divergente.
Marcelo Andrade destaca que esse Tometes não é muito abundante. O ambiente em que vive é o que favorece essa baixa densidade. Ele foi encontrado apenas nas corredeiras de rios em Unidades de Conservação da Serra dos Carajás, e fazer a coleta em habitats como esses não é uma tarefa fácil. Por essa razão, foi preciso descrever a espécie com 31 exemplares, incluindo as coletas feitas pelo pesquisador da UFPA e outras realizadas nas décadas de 70 e 80, durante a construção da Hidrelétrica de Tucuruí, durante as famosas expedições do biólogo americano Michael Goulding. "Ele (Goulding) coletou nas corredeiras de Tucuruí antes da formação do lago da hidrelétrica, que suprimiu essa espécie daquela região", revelou.
Marcelo e os Tometes já têm uma história de quase dez anos, desde a graduação até o mestrado e doutorado no Programa de Pós-Graduação em Ecologia Aquática e Pesca da UFPA. Esse gênero entrou na vida de Marcelo em 2009 e nunca mais saiu. No caso do Siderocarajensis, o pesquisador começou a estudá-lo e descobriu que a maioria do material taxonômico da espécie estava fora da Região Norte. Encontrou publicações de Michel Jégu de 2002, foi atrás de mais exemplares e, quando finalmente conseguiu as referências e as outras espécies, teve a convicção de que se tratava de um ilustre novo pacu. Essa certeza veio em 2015, depois de cuidadoso trabalho de análise molecular. "Existe familiaridade morfológica entre as espécies", disse, pontuando que a análise molecular foi decisiva para esclarecer todas as dúvidas.
Este é o quarto Tometes descrito por Marcelo Andrade. A primeira descrição aconteceu em 2013, com a espécie Tometes camunani, nome dado pelos índios Wai Wai do rio Trombetas, oeste do Pará; a segunda em 2016, Tometes kranponhah, outro nome indígena, segundo os Xikrin no Xingu, e a terceira, Tometes ancylorhynchus, de 2016, que ocorre nas regiões dos rios Xingu e Tocantins.
Entre as inúmeras responsabilidades que a descrição de uma nova espécie exige, o pesquisador do GEA ressalta que a principal delas é advertir que o Tometes siderocarajensis é uma espécie sensível à perturbação antrópica, tanto que já não é encontrado na região de Tucuruí, desde a construção da hidrelétrica. Assim, onde há uma intervenção humana mais forte nos habitats onde vivem, as chances de eliminá-los dessas áreas é gigantesca. Por isso, destaca-se de extrema importância a preservação de áreas como unidades de conservação para a preservação de espécies.
Além de ser conhecido há três décadas por pesquisadores americanos, esse pacu também é um velho conhecido dos amantes de pesca esportiva, que gostam de pescá-lo porque ele exige uma técnica diferenciada na captura e promove uma "boa briga" no ato da pescaria.
Texto: Micheline Ferreira
Foto: Marcelo Andrade
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