Mães ainda enfrentam desafios no mercado de trabalho
Não é difícil encontrar uma mulher que concilie as funções de trabalho e maternidade. A médica Cerena Park Han, de 30 anos, é um exemplo. Cerena é mãe do Vicente, de 11 meses, e trabalha em uma unidade de saúde em Belém. Segundo ela, antes mesmo de terminar a licença maternidade, pensou em pedir demissão do emprego para se dedicar totalmente ao filho. Ela conta que só se sentiu mais segura para voltar a trabalhar depois que uma pessoa de confiança, indicada por outros familiares, passou a cuidar do bebê enquanto ela não estivesse em casa.
E mesmo quando voltou ao trabalho, sentia-se preocupada com o filho e por isso mudou sua rotina de trabalho. “Hoje eu não dou mais plantão porque ele sente muito minha falta, ainda é muito bebê. Antigamente, eu ia para o interior, passava dois ou três dias dando plantão direto, e agora mudou totalmente. É só o trabalho de consultório mesmo”, diz.
Cerena também conta que se sente culpada por, de certa forma, achar que sobrecarrega o marido, também médico, e que acaba trabalhando um pouco mais. “Ele é que vai e passa dois ou três dias de plantão, não tem feriado, não tem fim de semana. Me sinto culpada porque me sinto sobrecarregando ele.”
A servidora pública Glauce Monteiro é mãe do Erick, de seis anos, e do Adrick, de três, e contou com a ajuda de familiares para voltar com mais tranquilidade ao trabalho. Ela conta que seus filhos chamam suas tias-avós de mães. “Tenho orgulho disso e sinto profunda gratidão a elas por isso: por terem sido e ainda serem referências maternais aos meus filhos”, diz a jornalista, que acredita que isso também serviu para reforçar unir e fortalecer seus laços familiares.
Glauce conta que, mesmo assim, sente prazer em trabalhar. “É muito complicado ser mãe e apenas mãe. Esse é um trabalho muito árduo e que deve ser valorizado. Para mim, trabalhar é também manter viva uma parte de mim, de minha personalidade, identidade, que não está diretamente relacionada aos meus filhos. Nesse sentido é uma espécie de pausa no meu trabalho contínuo e principal, que é ser mãe do Erick e do Adrick, e acho que só faz bem a todos nós.”
Mito da super-mulher - A psicóloga e professora da UFPA, Milene Veloso, relata que esse sentimento de culpa que a Cerena e a Glauce sentem é bastante comum entre muitas mulheres. De acordo com a professora, existe uma cobrança interna que muitas mulheres se fazem para que elas deem conta de tudo. Isso ocorre por causa de exigências sociais direcionadas a elas.
A pesquisadora explica que a mulher tem seu espaço reconhecido no mercado de trabalho, mas ainda se vê diante de muitos desafios, como equilibrar a vida profissional e a vida maternal. “As condições para a inserção da mulher no mercado de trabalho são complexas, pois várias pressões estão presentes como a necessidade constante de qualificação e a responsabilidade com as tarefas domésticas que ainda permanece."
E a pressão pode até mesmo prejudicar a relação entre mães e filhos. “Uma mãe que não se sente minimamente realizada, que sofre muitas pressões e vive sob intenso estresse, terá muitas dificuldades em manter um relacionamento saudável com seus filhos. Ou seja, o sentimento de culpa vem exatamente dessa cobrança em equacionar todas as demandas e sentir que não está destinando um tempo de qualidade para estar com seus filhos”, constata Milene Veloso.
Mães de filhos pequenos têm mais dificuldades de encontrar trabalho – Segundo uma pesquisa coordenada pela professora e pesquisadora do curso de Estatística da UFPA, Marinalva Maciel, na zona urbana da região Norte, o fato da mulher ter filhos menores de 7 anos diminui em 30% sua participação no mercado de trabalho. O mesmo já não se repete na zona rural.
A pesquisadora acredita que isso ocorre porque, na zona rural, outros membros da família assumem parcialmente o cuidado das crianças, situação favorecida pelos parentes residirem mais próximos uns dos outros.
“Na zona urbana, devido à distância de moradia entre os familiares, isso não é possível, sendo necessária a utilização de creches. Como as creches públicas são escassas na região Norte, há uma dificuldade da mulher se inserir ou permanecer no mercado de trabalho com filhos pequenos”, conclui.
Políticas públicas podem melhorar a conciliação de emprego e maternidade - A professora Milene Veloso defende a existência de políticas públicas mais sérias em relação às necessidades das mulheres como uma forma de amenizar os sentimentos de culpa e também proporcionar um desenvolvimento mais saudável para as crianças.
“As mulheres precisam ser respeitadas, valorizadas, mas, além disso, precisam de creches de qualidade para deixar seus filhos, remuneração mais justa, melhores condições de trabalho e principalmente relações de gênero mais igualitárias nas tarefas atribuídas a elas em relação à casa e à criação dos filhos”, afirma.
Para ela, o ideal é dividir as tarefas e as responsabilidades com o parceiro, pois, quanto mais as mulheres permanecerem cuidando de tudo e centralizando todas as tarefas, mais difícil será transferir responsabilidades para o parceiro e a sobrecarga e o sentimento de culpa serão ainda mais fortes.
Não existe mãe perfeita - A professora acredita que as mulheres devem resistir ao estereótipo, muitas vezes mostrado na publicidade da TV e de outras mídias: o da mulher perfeita, que cuida da casa e se sente realizada por isso.
“Romper com esses paradigmas é mais uma das coisas que a mulher de hoje deve também enfrentar e desconstruir. Buscar ter uma relação mais autêntica com nossos filhos, não ter medo em demonstrar nossas dificuldades, dividir as tarefas desde cedo com todos os familiares e repassar às crianças valores como a empatia e solidariedade. E principalmente que as mulheres busquem sua realização de acordo com o seu desejo e não apenas por cobranças sociais”, finaliza a psicóloga e professora da UFPA, Milene Veloso.
Dia das mães – Para Glauce, o dia das mães é uma data para se refletir e se repensar como mãe, nos cuidados e nas orientações que estão sendo dadas aos filhos. Ela também acredita que é uma data para, também, se aproximar da própria mãe. “É hora de valorizar e repensar minha relação com a minha mãe. Um pouco de colo, uma conversa mais longa. É um momento de reforçar para ela o quanto ela é única, especial e uma inspiração para mim como mulher, profissional e mãe.”
Apesar das dificuldades em conciliar as duas rotinas, a médica Cerena assegura que sempre achou que sua realização de vida seria mesmo na maternidade. “Mesmo que eu estivesse realizada profissionalmente, tivesse tudo, se eu não fosse mãe, eu não estaria tão feliz quanto eu estou hoje”, diz emocionada. Ela conta que tudo vale a pena quando se chega em casa e vê o sorriso do filho. Cerena se prepara para o primeiro dia das mães ao lado do Vicente e se mostra ansiosa para o momento. “Vai ser uma das datas que eu mais vou gostar no ano”, diz apaixonada.
Texto: João Pedro Bittencourt – Assessoria de Comunicação da UFPA
Foto: Reprodução / Google
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